Deputados, especialistas em educação e representantes de três ministérios foram unânimes ao afirmar nesta quarta-feira (8) que o problema da violência em escolas brasileiras deve ser combatido com ações integradas e abrangentes nas áreas de segurança pública, saúde e assistência social. Eles participaram de seminário promovido pelo grupo de trabalho da Câmara dos Deputados encarregado de propor normas para garantir um ambiente escolar seguro.
Coordenadora da bancada da educação, a deputada Professora Goreth (PDT-AP), que presidiu um dos painéis do seminário, disse que o evento mostrou que é preciso entender a complexidade do cenário ante de agir. “Temos aprendido que agir sobre a violência nas escolas demanda a criação de múltiplas estratégias, uma vez que um ato violento perpassa por múltiplas esferas”, disse.
No mesmo sentido, a deputada Tabata Amaral (PSB-SP), que preside a Frente Parlamentar Mista da Educação, destacou a importância de resistir ao impulso de procurar respostas fáceis para um problema complexo. Segundo ela, a resposta passa por ações nas áreas de segurança pública, saúde e assistência social. “Que a gente saiba dar respostas duras e firmes a cada um dos problemas”, propôs.
Ódio e bullying
Ao comentar complexidade do problema, a deputada citou o envolvimento de grupos de ódio, a prática de bullying e cyberbullying e aspectos ligados à saúde mental , como ansiedade e depressão. “Durante a pandemia em São Paulo, de cada dez estudantes da rede estadual, sete apresentaram sintomas de depressão e ansiedade. Não é um problema individual, é um problema coletivo”, pontuou.
A vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e secretária da área no governo do Rio Grande do Sul, Raquel Teixeira, relatou que a violência contra as escolas é um fato recente na cultura brasileira. “De 2002 para cá, nós tivemos 49 mortes ocasionadas por ataques em escolas e 115 feridos. São números inaceitáveis quando a gente lembra que a escola é um lugar sagrado, é o lugar onde a criança sonha, vive e aprende a se relacionar”, lamentou.
Ela destacou outros dados sobre violência e suicídio nas escolas. “Aumentou o número de casos de ansiedade, de depressão, de automutilação e de suicídio, assim como aumentou a agressividade. Tem caso de uma menina de 7 anos levando faca para escola para matar a coleguinha que fez fofoca do namorado dela. Isso mostra que precisamos de um novo olhar sobre a formação dos professores, sobre a rede de proteção às escolas e sobre a legislação”, acrescentou.
Perfil do agressor
A integrante do grupo de trabalho sobre violência nas escolas do Ministério da Educação, Miriam Abramovay, apresentou um perfil dos agressores. “Todos são do sexo masculino, motivados por discurso de ódio e por comunidades online que recrutam com base em ressentimentos emocionais, valores reacionais, usando linguagem violenta, machista e racista. A gente também não pode esquecer que existe na sociedade brasileira uma cultura armamentista, uma glorificação da violência e do exibicionismo”, afirmou.
Miriam Abramovay apontou ainda que a violência nas escolas é um fenômeno global que costuma se apresentar a partir de fatos cotidianos. Segundo ela, isso não deve ser tratado com a lógica punitiva e repressiva, mas com políticas públicas concretas e abrangentes.
“Não se deve deixar de falar das violências do cotidiano, que tem a ver com as relações sociais, com o clima escolar, com o bullying, o cyberbullying, o preconceito, a discriminação. Uma das formas de prevenção e enfrentamento dessas violências são programas de convivência escolar, que abrangem desde uma pesquisa diagnóstica participativa até a formação de profissionais da educação, a participação ativa de crianças e adolescentes e o mapeamento das redes de apoio”, sugeriu.
Papel dos pais
Alesandro Barreto, coordenador do Laboratório de Operações Cibernéticas do Ministério da Justiça e Segurança Pública, também defendeu o foco em ações de prevenção e chamou atenção para o papel dos pais. “Tem nos surpreendido – e na busca e apreensão de hoje mais uma vez ocorreu: o pai e a mãe não sabem o que o filho está fazendo na internet. Deixa o filho o dia todo conectado e ele termina por ser cooptado por criminosos”, relatou.
Segundo ele, outro aspecto importante é que o agressor não tenha notoriedade. “Temos que criar algum tipo de recurso para evitar que pessoas em busca de curtidas e engajamento em suas redes sociais divulguem imagens dos criminosos. O criminoso não deve ter notoriedade, tem que ter é cadeia.”
A presidente do Instituto Singularidades e ex-diretora global de educação do Banco Mundial, Claudia Costin, lembrou a tragédia em Realengo, zona oeste do Rio de Janeiro, que deixou 12 crianças mortas em 2011. Na ocasião, Claudia Costin era secretária de Educação do estado. O crime foi cometido por um ex-aluno de 23 anos que levou dois revólveres à Escola Municipal Tasso da Silveira e disparou contra os alunos, todos de 13 a 15 anos. “É importante aproveitar um pouco do que se aprendeu no Brasil desde então”, disse.
Rondas escolares
Para Claudia Costin, é preciso estar atento para evitar fórmulas que não deram bons resultados no Brasil e em outros países. “As rondas escolares são importantes, mas é preciso tomar cuidado com questões delicadas, como a ideia de colocar detectores de metais e policiais armados dentro de cada escola. A experiência internacional não apoia esse tipo de medida. Boa parte das escolas atacadas nos Estados Unidos tinha detector de metais e policiais presentes”, comentou.
Ela também apontou como medida desejável um processo de “cura” para alunos e professores após atos de violência. Entre as medidas estariam o cancelamento de aulas no dia seguinte e o encaminhamento para tratamento psicológico de quem precisa de apoio adicional, além de dinâmicas com crianças e professores.
O deputado Jorge Goetten (PL-SC), coordenador do grupo de trabalho, lembrou o ataque a uma creche em Blumenau em abril deste ano, quando quatro crianças foram mortas e cinco ficaram feridas por um homem de 25 anos. Ele afirmou que a expectativa do colegiado é aprovar sugestões para combater a violência nas escolas até o fim de novembro.
“Quando a gente trouxe lá no início os familiares das vítimas de Blumenau que vieram para cá, eles acreditaram que é possível criar uma política pública nacional de combate à violência nas escolas. A gente foi se aprofundando ouvindo vocês e tem sido uma riqueza muito grande. A gente constata que a melhor ideia é a soma de várias ideias”, afirmou.
A relatora do colegiado é a deputada Luisa Canziani (PSD-PR).
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