Chuvas intensas, calor excessivo, água e fogo atingindo o solo, a vegetação, os animais e os humanos. Condições climáticas que deveriam ser favoráveis, agora estão em desequilíbrio. Adaptar-se aos extremos climáticos se tornou uma questão de sobrevivência e a Ciência e Tecnologia se posicionam como aliadas na busca por segurança alimentar, hídrica e energética, saúde e infraestrutura modal.
O Estado da Paraíba já entendeu que essa discussão sobre mudanças climáticas e o intercâmbio entre áreas do conhecimento na procura por soluções ou formas de amenizar os impactos para a população deve acontecer. É por isso que, desde 2022, a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior (Secties) produz o Painel de Mudanças Climáticas em João Pessoa. Em 2024 a atenção continua, o encontro está previsto para acontecer em toda Paraíba, com o propósito de reunir as secretarias que compõem o governo, para trazerem soluções ajustadas ao cenário de mudança do clima.
Mas, para além disso, pesquisas acadêmicas vêm sendo desenvolvidas para somar na compreensão dos fatores e aspectos que justifiquem as mudanças climáticas. O Observatório da Caatinga e Desertificação (OCA), coordenado por Aldrin Pérez-Marin, pesquisador do Instituto Nacional do Semiárido (INSA), e John Cunha, professor da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), já constatou algumas informações importantes, como o fato de que a natureza responde positivamente às condições favoráveis de vida na Terra quando opera em equilíbrio.
Pérez e Cunha também são vinculados ao Observatório Nacional da Dinâmica da Água e Carbono no Bioma Caatinga (INCT - Onda CBC), que estuda os efeitos da variabilidade climática no funcionamento do ecossistema Caatinga. Nesse processo, identificaram, por exemplo, que em 2022 choveu muito e a umidade foi excessiva na área experimental do OCA, na região de Campina Grande. A vegetação estava verde, mas com eficiência abaixo do normal para captura de carbono. “Isso porque o sistema natural opera não só através das folhas verdes, mas também junto ao solo, na serapilheira [troca de nutrientes entre a planta e o solo]. A alta umidade do solo provocou uma instabilidade neste ecossistema”, explicou Aldrin Pérez.
Em anos considerados extremamente secos, os pesquisadores observaram que a vegetação deixou de captar o carbono da atmosfera para poder se desenvolver, fazendo o processo inverso e emitindo o gás. “A vegetação respirava para sobreviver, mas não conseguia crescer e, portanto, não realizava a captura do carbono da atmosfera, tornando-se uma fonte de carbono”, acrescentou John Cunha.
Esse é o ponto que o professor destaca sobre os anos com variabilidade climática que fogem do normal: “seja em condições muito úmidas ou muito secas, esses extremos trazem prejuízos porque o sistema funciona com menor eficiência no sequestro de carbono, reduzindo a sua capacidade de mitigar os efeitos das mudanças climáticas”, justificou Cunha.
A Caatinga também é pauta de pesquisas de um outro grupo de professores, graduandos e pós-graduandos, que estudaram a adaptação da fauna de répteis e anfíbios da área e situação de mudanças climáticas. O professor Daniel Mesquita, da Universidade Federal da Paraíba, coordenou o projeto “Passado, presente e futuro da caatinga: história, ecologia e conservação da herpetofauna frente às mudanças ambientais”, já finalizado.
Ao observar o comportamento de anfíbios e répteis que vivem na Caatinga e em regiões de transição com o Cerrado, os pesquisadores constataram que o comportamento desses animais altera com a mudança da temperatura, o que pode influenciar no acasalamento e, consequentemente, sobrevivência de espécies já ameaçadas de extinção. Há uma nova expedição prevista para coleta de dados e investigações nesta linha, com apoio do governo da Paraíba, por meio do Edital Universal, da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba (Fapesq).
Temperaturas também aumentam nas águas do oceano
De acordo com a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA, em inglês), o mês de maio de 2024 foi o 14º mês consecutivo com temperaturas recordes nos oceanos, uma série que vem ocorrendo desde abril do ano passado. A temperatura da superfície global no acumulado de janeiro a maio deste ano foi classificada como o período mais quente já registrado, com 1,32 graus C acima da média.
Com maior capacidade de filtrar o ar do que a Floresta Amazônica, o oceano retira o gás carbônico (CO2) do ar com maior eficiência e o mantém nas profundezas; atua como um regulador do sistema climático planetário e promove um ambiente apropriado para a vida em quase toda a superfície da Terra.
Para a bióloga marinha Karina Massei, do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Monitoramento Ambiental (PPGEMA/UFPB), o desvio de temperatura padrão no oceano é perigoso. “Essa região dos trópicos onde está situada a Paraíba é a mais impactada com o calor. Nesse ano, em março e abril, a temperatura média do oceano no nosso litoral bateu os 29 graus C. Isso significa que houve dias mais quentes, com até 31 graus C”, ressaltou Massei.
O impacto dessas alterações de temperatura se dá diretamente nos corais – animais agrupados nos recifes ao longo da costa. Com o calor, a água se torna mais ácida e, consequentemente, a alga microscópica chamada zooxantela, que vive em simbiose com o coral compartilhando nutrientes, se desprende dele. Diante disso, o coral passa a ter dificuldades de adquirir os nutrientes, perde a cor e adoece, ficando suscetível a ataques de fungos ou bactérias que anteriormente estaria apto a combater. Ou seja, o coral corre risco de morrer.
Karina explica que o ambiente onde vivem os corais são primários na cadeia alimentar. Um ecossistema com fontes de alimento desde a mais micro das algas até os tubarões. “Perdendo a vida nos recifes, quebra-se uma cadeia alimentar que vai afligir diretamente os humanos”, alertou a pesquisadora.
Nesse sentido, está em andamento a pesquisa “Restauração Ecológica de Corais”, que visa a recuperação de corais com o uso de diferentes metodologias. O estudo conta com o apoio do Governo do Estado da Paraíba por meio do Programa de Bolsas de Pesquisa de Pós-Graduação, através da Secties e da Fapesq. Além de parceiros da iniciativa privada, de organizações não governamentais e de moradores locais.
Plataforma indica riscos de impactos climáticos
Um exemplo prático da participação tecnológica no auxílio ao entendimento em relação às mudanças climáticas é o Adapta Brasil, o Sistema de Informações e Análises sobre Impactos das Mudanças do Clima. Ela é uma ferramenta capaz de fazer análises “de informações cada vez mais integradas e atualizadas sobre o clima e os riscos de impactos no Brasil”, conforme diz a plataforma.
Esse sistema foi instituído em outubro de 2020, pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), com o objetivo de “consolidar, integrar e disseminar informações que possibilitem o avanço das análises dos impactos da mudança do clima, observados e projetados no território nacional, dando subsídios às autoridades competentes pelas ações de adaptação”.
O projeto é coordenado por Jean Ometto, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em cooperação com a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) e fomento por meio do MCTI, amparado por uma grande rede de instituições colaboradoras, pesquisadores e consultores. A consulta pode ser feita por qualquer pessoa que queira informações sobre os riscos de impactos no Brasil, pontos fracos e fortes, vulnerabilidades, de municípios, estados e regiões para questões de recursos hídricos, segurança alimentar, energética, infraestrutura portuária, de ferrovias e rodovias, desastres hidrológicos e saúde. Os dados são subsídios para os gestores públicos planejarem ações preventivas.
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