A artesã Maria Rosa veio de Vista Alegre, zona norte do Rio de Janeiro, para as celebrações na Igreja de São Jorge, na região central da capital. Como faz todo ano no dia 23 de abril, dedicado ao santo católico, ela pediu ajuda para enfrentar os problemas que tem passado.
“Eu venho pedir muita força e saúde. Preciso conseguir um trabalho, porque tenho um pai com câncer de pele, que precisa muito de mim. E venho pedir para a minha mãe também, que é idosa e sofre com muitas dores no corpo”, diz Maria.
A fila para entrar na igreja dava a volta em um quarteirão longo. Debaixo do sol forte do meio-dia, os fiéis esperavam pacientemente, com a expectativa de sair dali renovados. O funcionário público Leonardo Nascimento, de 36 anos, desceu as escadas da igreja com os olhos lacrimejando e a respiração ofegante.
“Toda vez que venho aqui é uma energia surreal. Sempre saio emocionado. Estar na igreja, na fé, na companhia dos santos”, explicou Leonardo.
“Minha ligação com São Jorge vem desde criança, por causa da família, especialmente minha mãe. É uma coisa que mexe comigo, que me dá força para seguir na vida, mesmo com todas as batalhas e dificuldades”.
Quem atravessava a rua em direção ao palco principal, montado do lado de fora da igreja, recebia um banho de água benta. Vestido com uma batina longa e preta, com o rosto encharcado de suor, o seminarista Marcos Paulo Telles, de 22 anos, era o responsável por mergulhar a escova no balde e molhar os fiéis.
“Como seminarista, é muito bonito ver a devoção do povo. Estou no processo para ser padre, e isso faz com que eu cresça em amor ao povo e à pastoral. Não importa o calor, as filas longas, o povo faz questão de interceder e estar próximo. A gente asperge água benta neles, mas eles também trazem as bençãos deles para a gente”, disse Marcos.
Poucos metros ao lado, três representantes de religiões de matriz africana ofereciam mais uma opção de ritual com banho. Com roupas claras e rendadas, colares de diferentes cores e sorrisos no rosto, ofereciam uma limpeza especial.
Quem se aproximava, recebia primeiro a água que saía das folhas de aroeira. Em seguida, um banho com arroz, símbolo de equilíbrio, sementes de girassol, para trazer prosperidade, e milho, representando alimentação e fartura do orixá Ogum.
O babalorixá Luiz Alberto de Oxóssi, do candomblé, explicou que data é uma oportunidade especial para tornar o ritual mais acessível e interagir com os fiéis católicos.
“Fazer uma limpeza de corpo completa geralmente sai muito caro, envolve muito gasto. Então, a gente traz isso para rua e para o povo, para os mais carentes, para quem precisa de um axé rápido e de energia positiva”, explicou Luiz.
“Hoje a gente reverencia São Jorge e Ogum, e os povos se respeitam bastante. Todo mundo fica junto: os padres e os babalorixás ocupando o mesmo espaço”.
A manicure Julia Firmino Rosa, de 27 anos, era um exemplo concreto desse sincretismo. Umbandista, ela trouxe toda a família: irmão, filhos e mãe. E estava cumprindo o itinerário completo de quem participava das celebrações a São Jorge.
“A gente sempre faz o mesmo ritual todo ano. Primeiro, assiste à missa. Depois entra na fila para entrar na igreja e agradecer. Na volta, passa pelo banho dos orixás aqui do lado”, diz a manicure. “É um santo muito importante para a gente, que é muito devoto. Viemos agradecer pelos livramentos e por estar com saúde”.