Participantes de uma audiência na Câmara dos Deputados defenderam, nesta segunda-feira (24), a aprovação de dois projetos de lei que buscam combater casos de importunação sexual e de violação de privacidade.
Um dos projetos ( PL 348/24 ) impede a realização de acordo de não persecução penal nos casos de crimes contra a dignidade sexual praticados contra mulher e aumenta a pena mínima da importunação sexual, de um para dois anos de reclusão.
O acordo de não persecução penal é um ajuste jurídico pré-processual fechado entre o Ministério Público e o investigado. Nele, as partes negociam cláusulas a serem cumpridas pelo acusado, que, ao final, é favorecido com a extinção da pena.
A outra proposta (PL 4924/23) altera o Código Penal para criar o crime de violação virtual de domicílio, punível com reclusão de dois a cinco anos, mais multa. O texto define o crime como o ato de entrar ou permanecer, contra a vontade expressa de quem é de direito, em casa alheia ou em suas dependências por meio de dispositivo eletrônico conectado ou não à rede de computadores.
Relatos
Autora dos dois projetos, a deputada Dayany Bittencourt (União-CE) defendeu que as matérias entrem na pauta do Plenário o mais rapidamente possível. A parlamentar, que conduziu audiência na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, relatou que ela própria teve sua privacidade invadida. Em sua casa, foram encontradas câmeras, inclusive no quarto e no banheiro.
“Eu tive de ter acompanhamento psicológico, psiquiátrico. Até hoje, os problemas me acompanham. Hoje, quando viajo para um local, antes de dormir eu tampo todos os buracos do quarto com papel higiênico. Não consigo mais ficar à vontade em hotel nenhum com medo”, declarou a parlamentar. “Quando vejo uma pessoa sorrindo para mim, não sei se é alguém que está me reconhecendo de uma forma que eu não gostaria.”
A nutricionista Larissa Duarte Aguiar deu o outro testemunho da audiência. Ela disse ter sido importunada sexualmente dentro de um elevador, por um homem, ao sair do trabalho às 11 horas.
“Esse homem apalpou minhas partes íntimas. Fiquei sem acreditar, transtornada, um mix de sentimentos. Angústia, tristeza, revolta, sentimento de impunidade. Eu estava no meu ambiente de trabalho. Esse homem invadiu meu espaço, minha privacidade”, contou Larissa.
Ela chegou a denunciar o caso em uma delegacia, mas reconhece a dificuldade que muitas mulheres vítimas têm em contar o que passaram. Larissa acredita que todo caso de estupro ou feminicídio é precedido de importunação sexual, que, sem ser punida, dá coragem para que o agressor pratique crimes mais graves.
Na opinião da nutricionista, além de uma punição mais severa para a importunação sexual, o projeto de Dayany Bittencourt deveria prever também medidas educativas para os agressores e a frequência em grupos de reabilitação, para que se conscientizem sobre violência de gênero.
Falta de clareza
Segundo a delegada-chefe da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher I, em Brasília, Adriana Romana, muitas vezes a vítima sequer percebe que é vítima, especialmente quando é “encoxada” em um ônibus lotado, por exemplo.
Sobre os PLs, Adriana Romana avaliou que eles podem inibir a importunação sexual ou a invasão virtual de privacidade.
“Quanto mais a gente retirar a possiblidade de acordo [de não persecução penal], mais a gente vai enfrentar isso com seriedade. Se a pessoa pratica, vai para o Judiciário, paga não sei quanto e aquilo tá resolvido, ele vai fazer de novo”, considerou. “Sobre o outro projeto, a gente já tem violação de dispositivo de informática, que vem sendo usado para esse tipo de conduta, com pena de seis meses a dois anos. No projeto de lei, vai de dois a cinco anos. A gente vai ter penalização mais forte para trabalhar uma questão que é muito atual”, disse a delegada.
Também o advogado David Alcâncatara Isidoro considerou os projetos importantes. A sugestão dele é para que o PL que trata da invasão de privacidade também inclua os drones e todos os locais onde a vítima esteja e tenha sua privacidade invadida, seja em casa, no trabalho ou em um hotel.
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