Os cursinhos populares voltados para públicos específicos buscam preparar para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), além de mobilizar lutas sociais. É o caso do cursinho da Educafro Brasil, em São Paulo, voltado para a população negra e periférica, que tem como meta o acesso à universidade e combater a desigualdade educacional.
“Nós temos a missão de entregar à faculdade não só um aluno que passe na prova tradicional da faculdade, nós temos a missão de entregar um aluno questionador e lutador para ajudar a fazer acontecer as grandes transformações que sonhamos”, disse o diretor-executivo da Educafro, frei Davi.
Ele explicou que os estudantes têm aula de cultura e cidadania, com mesma carga horária das demais aulas como português e matemática, em que se trabalha fortemente o combate ao racismo.
“Nosso sonho é que esses alunos que vão ingressar nas universidades públicas tenham a capacidade de questionar o currículo dessas universidades que são exageradamente eurocêntricas e marginalizam todo o saber afro e indígena”, revelou.
“Nós queremos a universidade plural também na sua pedagogia, na sua metodologia. Por exemplo, é um absurdo que grande parte das universidades públicas, dos vestibulares, não cobra livros de autores africanos, isso é um atentado contra nós afro-brasileiros, só cobram livros de autores de origem europeia, isso não está certo”, acrescentou.
Outro problema apontado pelo diretor é a falta de responsabilidade de sucessivos governantes que ocuparam o Ministério da Educação ao não garantir a permanência de estudantes negros nas universidades por falta de políticas públicas. Segundo ele, a situação gerou grande estrago aos jovens negros que entraram na universidade e depois precisaram abandoná-la por dificuldades financeiras.
“O governo federal, quando adotou cotas, prometeu que todos os alunos que tivessem como renda até um salário-mínimo e meio, todos eles receberiam imediatamente bolsa moradia e bolsa de alimentação. E o governo até hoje não bota isso em prática”, reivindicou.
Luiz Henrique, de 24 anos, está se preparando para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano por meio do curso preparatório para vestibulares que a Educafro oferece. “A Educafro foi o que nos permitiu ir além do ensino, que geralmente é deficiente, nas escolas públicas, que é oferecido para nós, porém, não só isso, como também a Educafro é um meio de reunir várias pessoas sob a mesma égide, da luta contra o racismo através de pautas sociopolíticas e econômicas”, ressaltou.
Ele pretende fazer a graduação em Engenharia Mecatrônica, Direito ou Engenharia da Computação, mas esse não é um objetivo isolado para o estudante. “Para nós, a importância que damos para o ensino superior se baseia não só na qualidade de ensino e na possibilidade de uma carreira digna a um nível individual, como também na oportunidade de alavancar o coletivo do povo negro a possuir as mesmas possibilidades oferecidas a outras etnias, através de uma rede de apoio e de contatos, tornando o ensino superior de qualidade”, disse.
O estudante aponta ainda que a escolha das profissões passa por um desejo de construção coletiva da sociedade. Sobre a Engenharia Mecatrônica, ele acredita ser uma área importante para a soberania nacional, e relacionou os outros dois cursos diretamente ao combate ao racismo.
“Direito, pois acredito que é o melhor curso para proteger a população negra das injúrias cometidas seja no mercado de trabalho ou pelas instituições que deveriam nos proteger, porém, abusam do poder que é confiado a eles, e Engenharia da Computação, porque é uma área que está em alta, e quero fazer parte dos esforços da população negra para o acesso a essa”, finalizou.
A estudante Pamella Santos, de 38 anos, também está se preparando para a prova do Enem por meio da Educafro. “Eu estou muito determinada e focada nos estudos pois, desde de que comecei a fazer o cursinho da Educafro, melhorei muito minha pontuação no Enem, coisa que não conseguia nas provas dos outros anos”, contou.
“Eu sou uma pessoa totalmente justa e sempre busco a justiça, a igualdade, a defesa e conhecimento fazendo com que a nossa Constituição seja realmente válida e reconhecida”, disse a estudante, que pretende cursar Direito.
Ela acrescentou que a Educafro teve papel relevante em sua busca pelo ensino superior, porque há a possibilidade de a entidade fornecer computador para quem precisa, os professores têm boa bagagem de conhecimento e há atendimento psicológico à disposição.
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