Os riscos de uma eventual privatização da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) foram tema, nesta sexta-feira (14), de audiência pública conjunta das Comissões de Cultura; de Ciência e Tecnologia e de Educação da Câmara dos Deputados. Responsável, entre outros veículos, pela TV Brasil, Agência Brasil, e pelas rádios Nacional, Nacional da Amazônia e MEC. Em abril, a EBC foi incluída no programa de privatização do governo federal por meio de decreto presidencial. A recomendação foi feita pelo Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
Na audiência, o secretário executivo do Ministério das Comunicações, Vitor Menezes, afirmou que a EBC é de “extrema importância” e destacou que não há decisão tomada sobre os rumos da empresa. Menezes ressaltou que a intenção do governo é – a partir de um estudo financiado e apresentado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – buscar caminhos que proponham “ganhos de eficiência e resultados para a empresa com vistas a garantir sua sustentabilidade econômico-financeira”. “Como cidadão, não vejo extinção da EBC, pelo menos, no nosso horizonte a curto prazo. Não é isso que nós estamos buscando. Não é essa a intenção do nosso ministro [Fábio Faria], afirmou.
Segundo o secretário executivo, a inclusão da EBC no Plano Nacional de Desestatizações (PND) ocorreu pelo fato de que os estudos em curso só podem ser custeados com orçamento do BNDES no caso de empresas que estão no programa. Ainda em defesa da medida, Vitor Menezes ponderou que o banco é uma instituição que pode trazer uma análise “equidistante” sobre a empresa, diferentemente do que poderia ocorrer se fosse contratado um estudo pela própria EBC ou pelo Ministério das Comunicações, ao qual ela é subordinada.
Menezes lembrou que a empresa hoje é custeada em grande parte pela Contribuição para Fomento da Radiodifusão Pública (CFRP) e por receitas próprias, mas, ainda assim, como toda empresa que não é autossuficiente, depende de uma parte subsidiada pela União.
A CFRP foi instituída em 2008, na lei de criação da EBC, que determinou que, no mínimo, 75% do Fundo de Fiscalização de Telecomunicações (Fistel) deverá ser destinado à empresa com o objetivo de propiciar meios para a melhoria dos serviços de radiodifusão pública e para ampliação de sua penetração mediante a utilização de serviços de telecomunicações.
Segundo dados apresentados pelo Ministério das Comunicações, em 2020, a arrecadação dessa contribuição foi de R$ 230,1 milhões, dos quais 96%, R$ 222,3 milhões, foram repassados à EBC. Coube à União subsidiar R$ 88,5 milhões.
O diretor-geral da EBC, Roni Baksys, que também participou da audiência, reforçou as afirmações do ministério sobre a situação atual da empresa e que é prematuro falar em qualquer modelagem. Segundo ele, o que se tem hoje é um estudo em 360 graus do negócio, abrangendo o contexto legal, estratégico, trabalhista, patrimonial e econômico-financeiro da EBC. Ao falar sobre ganhos e resultados da empresa nos últimos anos, Baksys ressaltou que o aprimoramento na gestão com o corte de contratos e redução de estruturas fez com que a complementação orçamentária da União para EBC caísse de R$ 330 milhões, em 2017, para R$ 88 milhões, em 2020.
Uma das hipóteses levantadas para cortar gastos da empresa de comunicação – e que pode constar do estudo do BNDES – é a venda de ativos, especialmente imóveis, o que já é discutido pela empresa. Roni Baksys detalhou que a EBC tem hoje 58 imóveis, 24 deles considerados estratégicos por estarem em uso ou nos planos da empresa, como, por exemplo, para construção de uma sede própria. A expectativa é que os demais sejam destinados à venda, por gerarem despesas de manutenção como água e energia, além de pagamento de taxas condominiais e Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).
Ao apresentar dados sobre a EBC, Roni Baksys disse que a empresa alcançou os melhores resultados de audiência de toda a série histórica desde sua criação. “O resultado garante o cumprimento da missão da EBC, ou seja, de nós estarmos chegando à casa do cidadão. Nós não temos interesse de competir com empresas privadas”, explicou.
Segundo ele, no ranking geral dos 95 canais abertos e por assinatura no país, a TV Brasil ocupa hoje a nona posição; em 2017, estava na 27ª. Outro dado destacado pelo diretor é que, dentre a audiência de 75 milhões de telespectadores medida pela Kantar Ibope Media – uma das maiores empresas de pesquisa de mercado da América Latina –, mais de 50 milhões tiveram algum tipo de interação com a TV Brasil em 2020.
A audiência da Agência Brasil também foi ressaltada por Baksys. Segundo ele, no universo de 170 milhões de brasileiros que formam a população digital do país, 95 milhões acessaram a agência pública em 2020. Levantamento feito pela EBC aponta que, por mês, a Agência Brasil tem uma média de 9 milhões de acessos, e cerca de 10 mil sites replicam seus conteúdos. De acordo com o diretor-geral, 12% do conteúdo replicado nos principais sites do país têm como fonte a Agência Brasil.
O diretor da EBC disse que a empresa segue com seu plano de expansão. Segundo ele, a prioridade é o parque de transmissão, no qual serão investidos R$ 80 milhões para a aquisição de transmissores. A ideia é que, até o ano que vem, o sinal da TV Brasil, que já está presente em 23 capitais brasileiras, chegue também a Rio Branco, Campo Grande, Curitiba e Vitória. A ideia também é aumentar o sistema público de rádio.
Projeto de expansão de alcance semelhante está previsto para a rede de rádios. A empresa tinha sete transmissoras em capitais e duas retransmissoras. Na semana passada, com a concessão da faixa estendida pela Secretaria de Difusão, do Ministério das Comunicações, são 14 rádios mais 15 afiliadas, que chegam a 17 capitais do país com sinal FM, da Rádio Nacional ou Rádio MEC.
A deputada Erika Kokay (PT-DF), uma das autoras do pedido para realização da audiência, lembrou no debate que a Constituição Federal prevê a existência dos sistemas público, privado e estatal, de forma que a permanência da EBC não pode ser colocada em risco. "A privatização ou extinção da EBC terá como consequências a eliminação de uma fonte importante de conteúdos educativos e culturais disponibilizados gratuitamente à população", defendeu.
Representante da Comissão de Empregados da EBC, a jornalista Akemi Nitahara ressaltou que a empresa é da “sociedade e não de governo”, e falou sobre os vários públicos que perdem com uma eventual privatização ou extinção da empresa. Nesse sentido, citou exemplos da qualidade da programação, especialmente a voltada para crianças, com seis horas de desenhos por dia. A jornalista também destacou o histórico da empresa, dos programas com temas de inclusão e das produções independentes e regionais que, por lei, devem ocupar 10% e 25%, respectivamente, da programação da TV Brasil. Na avaliação de Akemi, o fomento à arte, à cultura e ao audiovisual brasileiros também pode ser impactado. Programas que valorizam a cultura nacional e os de esportes que não têm espaço nas TVs e rádios comerciais também perdem, disse ela.
Representando o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, o jornalista Jonas Valente disse na audiência que o sistema público não foi criado para dar lucro em nenhum lugar do mundo. “[A EBC] é uma empresa dependente estatal, não há que se falar em déficit. Você não fala que uma universidade dá prejuízo, que um ministério dá prejuízo, você não fala que a Embrapa dá prejuízo”, acrescentou. Na visão do sindicalista, o governo vai gastar muito mais se tiver que pagar pelo serviço prestado hoje pela EBC.
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