Especialistas convidados pelo grupo que discute na Câmara dos Deputados a reforma na legislação eleitoral defenderam hoje (8) a regulação das empresas de big data, como forma de evitar o uso indevido dos chamados impulsionamento em períodos eleitorais e pré-eleitorais quando, a partir de informações pessoais, se faz disparos em massa voltados a favorecer determinadas candidaturas.
Big data é a área do conhecimento que trata, analisa e interpreta um grande volume de dados armazenados remotamente, obtidos a partir do uso que cada pessoa faz da internet.
“Tivemos a Lei de Proteção de Dados, mas ninguém fala como essas empresas de big data devem proceder no que se refere a campanhas eleitorais. Essas empresas hoje estão completamente à margem de qualquer tipo de fiscalização. Sofremos muito em 2018 com empresas de disparos de mensagens por Whatsapp e outras ferramentas”, disse o professor de Marketing e Comunicação Política, na Escola Superior de Propaganda e Marketing, Marcelo Vitorino.
Segundo o professor, o país carece de mecanismos legais que protejam o cidadão do uso indevido de disparos em massa, de mensagens que favoreçam grupos políticos ou prejudiquem, por meio de fake news, grupos adversários. “Hoje, na legislação, se um candidato faz um impulsionamento que prejudique um segundo candidato, não há na lei nenhum [artigo] que preveja algum tipo de punição proporcional. Se um candidato paga R$ 1 milhão para a veiculação de algo depreciativo a uma outra candidatura, o dano já está feito quase que de imediato. No entanto, não há na legislação uma reparação que, por exemplo, obrigue-o a compensar o candidato prejudicado com um impulsionamento do mesmo valor, para ser usado em favor da parte prejudicada, com o conteúdo que ela quiser”, argumentou.
Ainda segundo o professor, há que se pensar também em formas de evitar que um candidato compre o termo de outro candidato em sites de pesquisa, de forma a colocar sua propaganda visível nos sites do candidato adversário. “Precisamos ter alguma obrigação ou desobrigação que limite esse tipo de coisa, que é colocar a propaganda de um candidato na página do seu adversário, como forma de prejudicar a outra campanha”, acrescentou.
Um outro ponto defendido pelo especialista é a criação de uma turma especial para julgamentos relacionados a crimes virtuais. “Boa parte dos julgamentos acabam esquecidos porque a pauta do Judiciário é muito extensa e o crime em ambiente virtual tem uma proporção muito rápida”, disse.
“O problema é que [casos como esse] serão julgados seguindo o mesmo trâmite de crimes como o de placas [irregulares] na casa de alguém, algo que tem uma propagação bem mais lenta do que o da propagação dos crimes virtuais. Por isso é importante haver uma turma especial [no âmbito da justiça eleitoral], para que o crime virtual [praticado nesse âmbito] seja julgado na velocidade da qual a propagação deles funciona”, argumentou.
Vitorino propôs também que todo crime virtual cometido contra uma campanha tenha, como território do crime, o território nacional, e que o domicílio de trâmite do caso seja o domicílio da vítima, para que fique claro que a vítima não precise acionar a justiça em outras localidades.
Representante do InternetLab, um centro de pesquisa interdisciplinar que promove debates acadêmicos e a produção de conhecimento nas áreas de direito e tecnologia, Francisco Brito Cruz defendeu uma política de proteção de dados que tenha como foco central os direitos dos usuários e a integridade das eleições.
Segundo Cruz, uma questão importante está ligada ao fato de a autoridade nacional de proteção de dados ser um órgão ligado à Presidência da República, e não à Justiça Eleitoral. “Isso é uma questão que teremos de avançar nas discussões, porque há de se pensar qual o melhor arranjo para garantir que a legislação de proteção de dados seja cumprida por partidos, candidatos e coligações”, defendeu.
“Essa é uma questão super importante, principalmente no caso de eleições mais digitalizadas como a nossa, porque quando se fala de disparo em massa e de direcionamento de conteúdo em redes sociais, está se falando de dados pessoais. E quando existe mau uso de dados pessoais, existe uma possibilidade gigantesca de abusos. Seja abuso do poder politico, como o de listas de eleitores e cidadãos serem repassadas do poder público a candidatos, de forma ilegal; ou do poder econômico, quando empresas fornecem seus cadastros de forma ilegal para campanhas. Esse poder precisa ser regulado”, argumentou.
Representante do aplicativo Whatsapp, Dario Durigan disse que o software desenvolvido pela empresa na qual trabalha não é lugar de se fazer campanha eleitoral profissional nem de oferecimento de marketing político. “Não somos mídia social nem plataforma aberta, mas um aplicativo de mensagem privada que se mantém como ambiente onde se pode ter conversas privadas e pessoais, com muita segurança”, disse ao lembrar que, por ser um aplicativo destinado a “conversas consensuais trocadas de forma privada”, o Whatsapp não é considerado, segundo a própria Justiça Eleitoral, ambiente de propaganda eleitoral.
“Somos apenas uma plataforma de conversas privadas que quer se distinguir de plataformas abertas como o Facebook, que é uma espécie de praça pública do meio digital, onde as pessoas comentam e interagem”, complementou.
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